terça-feira, 16 de agosto de 2011



Sentado na bicicleta, os dois pés no chão, o rapaz conversa a ternura de palavras doces para a rapariga imobilizada pela emoção de o ouvir. Estão no portão do pequeno muro que delimita a casa que os pais dela construíram na terra herdada pelos avós; falam os dois, baixinho, quase escondidos pelas árvores pequenas que, do lado de dentro, acompanham o muro. A pele escurecida de ambos atrai-os um ao outro, o brilho dos olhos dela, a inocência do seu cabelo solto sobre os ombros e a ligeireza das suas roupas; ele, de calções caídos na cintura até ao joelho, o cabelo picado de gel, e a camisola preta de cavas que realça e melhora o corpo do seu trabalho na empresa de pequenas construções do pai. Nada mais acontece naquele momento senão as palavras que pouco importam diante dos sentimentos que se trocam; nem os vizinhos a disfarçarem mal que os estão a ver, nem os carros estupidamente excessivos dos emigrantes, nem o sol doentio do Verão. Importa-lhes apenas estarem juntos, todas essas preocupações só haveriam se o desejo não as superasse. Continuam a conversa da noite anterior, começada quase inesperadamente por entre a multidão que dançava e acompanhava a banda regional nos festejos da padroeira local. Embora vivessem perto um do outro, nunca houvera um impulso para estarem juntos; e nessa noite, enquanto as famílias de ambos se divertiam na reunião dos parentes que vieram do estrangeiro, e se copiavam grosseiramente êxitos musicais de outras décadas, eles encontraram-se a meio caminho entre o balcão das bebidas e o carro das pipocas: e um despertar ígneo se apossou do peito dele, do estômago dela, que os obriga a estarem juntos hoje. A paixão que os atrai durará os primeiros anos da sua relação; depois estarão juntos mais alguns anos por comodismo e habituação, até porque as suas famílias os obrigam; trair-se-ão mutuamente na busca de sensações novas; ela acabará por engravidar, e o casamento virá compulsivo. A filha deles, no portão da casa, estará, numa tarde quente de Agosto, a sorrir de prazer para um jovem a quem ela agrade.

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